quarta-feira, 14 de outubro de 2020

Comentário sobre o curta “Campeonato de pescaria” - Por Tatiana Maria Alexandre


 

Imagina a surpresa de assistir um curta no qual se passa no lugar onde você e toda sua família cresceram, ou mais, assistir um curta que retrata uma história que poderia ter sido vivida por ti e que traz cenas que são mais familiares do que o costume nessas obras, ou ainda mais, reconhecer em todo esse cenário um rosto familiar da sua infância... Foi assim que me senti quando assisti o curta “Campeonato de Pescaria” da Luiza Lins e Marco Martins.

O curta traz a história de um menino, o Dudu, que está se preparando para um campeonato de pesca que vai ter na vila. A família do Dudu têm como tradição a pescaria, o avô do menino era conhecido como um dos melhores pescadores, agora Dudu está com a pressão de perpetuar a tradição familiar e mostra insegurança quanto a isto, mas a avó do menino o tranquiliza e conta um segredo de família, que é revelado no dia do campeonato.

Vi no curta minha infância retratada, filha de um homem que pesca há 49 anos no Pântano do Sul, praia onde se passa o filme, e de uma mulher que além de pescadora nasceu e morou até os seus 24 anos na beira da praia do Pântano. Com tudo isso, minha infância se passou em grande parte na beira desta praia, aprendendo a nadar, pescar e salvar as sardinhas que meu pais deixavam pelo caminho na areia.

Durante o curta fui percebendo elementos que me traziam lembranças: o cesto de palha, a vara de pescar, o pescador remendando rede, o rancho dos pescadores, os botes na água, o mar tranquilo. É indescritível a sensação que tive quando fui percebendo que aquele curta poderia ser facilmente sobre minha infância, ou sobre a infância de alguém que eu conheço; fez com que eu me sentisse inclusa no mundo das produções cinematográficas, essa identificação e sensação de pertencimento é um elemento importante quando penso na educação e inserção social. Quando a criança, ou adulto, se identifica nessas obras a sensação é que não estamos sozinhos, que existem outras pessoas que vivem em uma realidade parecida com a sua e aquela complexidade aparente da sua vida é mais comum do que imagina e isso pode trazer uma leveza para as adversidades.

O ponto mais importante pra mim é quando os barcos vão para as águas e se dá início o campeonato, não apenas por ser o clímax do curta, mas porque no barco do Dudu reparei no homem com camiseta azul, que conduzia o bote, e percebi que aquele senhor fez parte da minha infância, era o seu Lé, amigo de longa data do meu pai e companheiro de pesca. No mesmo instante fiz questão de procurar o meu pai e mostrar seu hoje falecido amigo; não apenas por esse motivo, mas também por saber a importância que ele daria ao ver seu bairro e seus amigos numa produção que sua filha assistia para uma disciplina da sua graduação. E ficamos nós dois ali, comentando sobre o tempo em que íamos pescar na praia do Pântano, diante da imagem pausada do seu Lé.

Tatiana Maria Alexandre, 13 de outubro de 2020.

6 comentários:

  1. Muito interessante o curta, ter a oportunidade assistir, refletir e admirar as belezas locais e as artes produzidas por nós, manézinhos da ilha, em momentos de estudo é grtificante. Geralmente estudamos sempre olhando, percebendo e adimirando as outras pessoas, os outros lugares, os outros objetos sem perceber que o que nos pertence também é riquíssimo de cultura e aprendizagens.
    O curta me trouxe leveza por se passar na praia e me trouxe alegria porque mesmo em meio a competição da pescaria todos estavam alegres uns com os outros.
    Muito interessante ver essa perspectivava da imaginação junto com a tradição, e os modos que são feitos para que elas se efetivem por longos tempos.

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  2. Achei sensacional o relato da Tatiana, trouxe mais vida ao resumo do curta metragem. E assim como ela, cada parte do comecinho eu fui relembrando alguma coisa relacionada ao lugar, ao sotaque e assim vai.
    O fato do curta ser audiovisual me chamou muita atenção. No começo foi um pouco estranho mas me fez pensar na expansão que ele pode alcançar por permitir que muitos tenham acesso ao conteúdo.
    Além de super divertido, foi muito legal ver algo filmado na nossa cidade, "no quintal de casa".

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  3. ANDRÉ LUIZ UMEKI MACHADO

    O curta é um belo retrato da cultura da região, trazendo o sotaque, regionalismos e paisagens locais de maneira muito interessante. Gostei muito do trabalho dos enquadramentos, transições, e também da qualidade das imagens. Mesmo não sendo natural de Florianópolis, o curta me convidou a relembrar como é ser criança. Isto de se deve primeiramente pela forma como foi filmado: estamos sempre na mesma altura da criança - quando estão em grupo, o enquadramento nos dá a impressão de termos a mesma estatura. Em algumas cenas, não “vemos” elas por inteiro, apenas do tronco para cima; quando estão sentadas no chão, as imagens nos dão a impressão de estarmos sentados no chão também. Quando há um adulto em cena, algumas vezes ele é filmado “de baixo para cima”, o que reforça a impressão de termos a estatura de uma criança. Outro ponto que me fez relembrar a infância foi a relação entre o real e o fantástico. O pensamento mágico faz parte da “realidade” da criança, o mundo da imaginação não está totalmente desvinculado do mundo real. As cenas em que o peixe vai até o fundo do mar e que os peixes pulam no barco são feitas em forma de desenho animado, o que reforça a ideia de uma narrativa fantástica. Falando em narrativas fantásticas, achei muito interessante o curta fazer uma ponte entre a cultura dos pescadores da região e o pensamento mágico infantil, sintetizados em uma clara referência às famosas “histórias de pescador”, popularmente conhecidas por conter certos exageros, e até usadas como figura de linguagem.

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  4. Que bacana o seu depoimento Tatiana, as vivências da infância vão sendo esquecidas com o passar dos anos. E um resgate da infância é um tesouro que se tem que guarda no coração.

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  5. Que bacana o seu depoimento Tatiana, as vivências da infância vão sendo esquecidas com o passar dos anos. E um resgate da infância é um tesouro que se tem que guarda no coração.

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  6. Marcia Eduarda Garcez Isaac

    Lindo texto, Tati! Também penso na potencialidade que as produções locais possuem, e de como podemos trazê-las para as salas (tanto da Educação Infantil como do Ensino Fundamental) como recurso pedagógico para refletir sobre a constituição de nossas identidades e, sobretudo, sobre pertencimento e representatividade.

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